Como fazer panqueca
Agora pouco, fazendo panquecas para levar na marmita da semana, a Rebecca aparece na cozinha e diz:
– Você anotou as quantidades dos ingredientes?
– Não, por quê? Você quer colocar a receita no blog?
– Sim, eu queria…
E cá estou eu, sentado em frente ao computador enquanto ela assiste Sons of Anarchy…
Quem me conhece sabe que não há como eu pensar/falar sobre panquecas sem falar do meu pai. Seu Bigode era um cara que amava cozinhar. Mas, talvez por ter sido criado sob aquela ideia de que a cozinha era domínio feminino, ele dificilmente cozinhava (a não ser de madrugada, quando ninguém estava olhando). Quando entrava na cozinha, era pra fazer uma de suas poucas especialidades: bolinho de carne (que ele se negava de chamar de almôndega – já que empanava) e, muito mais comumente, panqueca.
Eu cresci vendo meu pai fritando panquecas. Na verdade, meu pai não chamava de panqueca, mas sim Bolo de Glória. Pra ele, panqueca era só quando estava com recheio. Ele contava uma história, daquelas bem velhas e apócrifas, sobre um dia em que Jesus visitou uma senhora e pediu comida. Ela disse que não tinha como preparar nada, pois só tinha farinha, água e um ovo. Foi então que Jesus a ensinou a fazer um bolo com a farinha, o ovo e água e fritar. Ela deu glórias e bem, acho que vocês entenderam…
Certa vez, liguei pra ele e pedi a receita. Ele me disse que era farinha, ovo, água e óleo. Então eu perguntei quanto de cada um. Ele disse: “ah, filho, eu não sei. Eu vou fazendo de olho. Eu coloco as coisas no liquidificador e vou adicionando até a massa ficar do jeito que eu quero”. Ou seja, ele não ajudou em nada. Lembro que tentei fazer panqueca nesse dia e foi um completo desastre. O motivo: uma frigideira ruim. Aliás, se existe um ingrediente essencial para boas panquecas é esse: uma frigideira boa, anti-aderente ou muito bem untada com óleo (veja bem, untar não é encher).
Na segunda vez que fiz panquecas meu pai já havia morrido. Eu não tinha mais como pedir a receita pra ele, então procurei na internet. Na verdade, eu fiz aquelas panquecas americanas, que são mais gordinhas. Eu usei a receita da panqueca do Arco-Iro, do Rolê Gourmet e fiz panquecas coloridas pra agradar a Rebecca. Até que deu certo, afinal, a frigideira era boa e eu tinha um bom motivo pra me arriscar na cozinha.
Depois disso fiz a mesma receita, mas tirando o fermento, para que ela ficasse fina. Como era pro café da manhã, fiz duas panquecas para cada um. Sobrou um pouco de massa, então decidi colocar um pouco de chocolate em pó e voilà: panqueca-doce! Recheamos com sorvete de creme e colocamos chocolate derretido em cima. Ficou uma delícia!
Certa vez eu decidi tirar o leite, trocando por água, já que lembrei que a do meu pai era assim: deu certo! Uma vez, eu me esqueci de adicionar o azeite na massa: deu certo, também! Outra vez eu decidi que não ia usar ovo, fazendo uma panqueca vegan de água e farinha: DEU ERRADO! É, tem algumas coisas que são essenciais para se fazer uma panqueca. E parece que ovo é uma delas! Até na receita de panqueca de banana vai ovo!
Mas, então, o que diabos eu estou querendo dizer aqui com toda essa lenga-lenga? Bem, o que quero dizer é que não existe jeito certo de se fazer panqueca, muito menos quantidade de ingredientes. Tudo é feito no olho, tentativa e erro. Esse foi o jeito que meu pai não me ensinou e é o jeito que pretendo não ensinar vocês. Afinal, panqueca não é nada mais do que uma massa frita. Prima da tortilha e do pão sírio, da panqueca americana e do okonomiyaki japonês, a panqueca é o prato mais punk que existe. Adaptando-se ao gosto de quem prepara, ela pode ser recheada com o que você imaginar.
Mais Do It Yourself, impossível!
E como toda cultura punk, a base para uma boa panqueca, como nos ensinou Jesus, é bem simples. O power trio: ovo, farinha e água. Se é a sua primeira vez, ou se quiser experimentar, você pode adicionar óleo (ou azeite normal, que eu prefiro). Mas, repetindo, se você estiver usando uma frigideira boa, anti-aderente, basta um fiozinho de óleo, espalhado com papel toalha de vez em quando, que você pode esquecer o óleo.
Eu costumo quebrar um ovo numa bacia, colocar uma boa quantidade de farinha (umas 6 colheres de sopa cheias), uns 2 copos de água e misturar com o fouet (se for preparar bastante, use um liquidificador). Essas não são as quantidades finais, mas sim apenas o suficiente pra você começar a mexer a massa e misturar os ingredientes. O ideal é fazer uma massa líquida.
Para isso, vá adicionando farinha ou água, até ficar do jeito que você sentir que está bom. O ovo, apesar de essencial, dura muito mais do que a gente imagina. Hoje fiz 14 panquecas e usei apenas 2 ovos (mas acho que conseguiria fazer com apenas 1). Se estiver incerto se a massa está no ponto ideal pra fritar, frite! Não há outro jeito de saber se está certo do que fazer. Meu pai costumava fritar umas 3 panquecas até acertar no ponto do sal (na verdade, acho que ele só fazia isso pra aquietar as lombrigas minhas e da minha irmã, que ~testávamos~ o sal pra ele nas panquecas prontas). Por falar nisso, se for fazer panqueca salgada, não se esqueça do sal, ok?
Com a massa pronta e a frigideira devidamente untada e já aquecida sob fogo alto, pegue uma concha de massa e coloque na frigideira, girando-a para preencher toda a superfície dela. Não é preciso encher de massa, basta apenas o suficiente para esconder o fundo.
A parte que as pessoas mais têm medo é virar a panqueca. Foi isso que me fez passar anos com medo de fritá-las. Mas, como já disse diversas vezes: se a sua frigideira for boa e estiver bem untada, não há o que temer. Antes de virar a panqueca, certifique-se de que ela não está mais colada ao fundo da frigideira. para isso, levante-a do fogo e, segurando-a pelo cabo, dê umas chacoalhadas. Se a panqueca soltar do fundo, ela já pode ser virada. Se não, espere fritar mais um pouco. Se você perceber que ela já deveria soltar, mas tem alguma parte prendendo-a, use um talher e, gentilmente para não estragar o anti-aderente, coloque-o embaixo de alguma parte da borda que já esteja solta. Siga por baixo da panqueca até a parte que estiver um pouco presa e, levemente, solte a panqueca.
Com a panqueca solta, basta criar coragem e jogar a frigideira pra frente e pro alto, como se criasse uma rampa de skate, forçando a panqueca a dar um mortal, caindo de costas. Parece assustador, eu sei, mas depois que você consegue a primeira vez, fica mais fácil. No final, como tudo que parece assustador de início, virar a panqueca se torna a parte mais divertida da receita (e você começa a se sentir o rockstar, apesar de estar fazendo apenas um powerchord do mais básico).
Se você virar a panqueca e ela cair meio torta, não se desespere. Você ainda tem alguns segundos pra tentar ajeitar com um talher, ou com a própria mão (depois de acostumado), a panqueca de volta na frigideira. Se não der tempo, termine de fritá-la do mesmo jeito. Ela não vai servir para rechear, mas vai estar gostosa igual! O mais importante é não desistir. Se depois de várias tentativas, ainda não conseguir, talvez o problema seja da frigideira.
Uma dica: deixe o papel com o excesso do óleo retirado da panela num canto, para voltar a untar quando precisar, sem ter que colocar mais óleo diretamente na panela.
Para o recheio, você pode colocar o que quiser. A minha mãe quase sempre recheava com carne moída ou com presunto e queijo (meu pai fazia apenas o Bolo de Glória). Hoje, para a marmita, fiz com carne moída mesmo. Porém, coloquei uns pedaços de queijo minas dentro, pra quando aquecer ficar um pouco mais mole. Além disso, coloquei molho pronto de tomate em cima e bastante queijo ralado.
Então é isso, agora você já sabe tudo o que precisa pra fritar sua primeira panqueca. Se você decidir arriscar, poste sua foto no instagram com a hashtag #minhamarmitatem ou mande para nós na fan page no facebook!
Um abraço!
Sandra Peres
20 de maio de 2015 at 15:48Quando eu estudava integral, tinha que levar marmita, eu só queria panquecas, ninguém mais aguentava nem ouvir falar de panquecas. Minha mãe tinha uma receita, que claro, nunca dava certo, sempre tinha um ingrediente para acertar e rendia panquecas para um batalhão.
Vou recomendar essa não receita para uma pessoa, vai que eu chego em casa e encontro panquecas pro jantar!
rebecca
3 de junho de 2015 at 11:37Panqueca é vida! hahaha
Deu certo? Tinha panquecas te esperando em casa?
Rebecca Bittencourt
23 de julho de 2015 at 14:21É INCRÍVEL como receita de panqueca rende, parece que ela se multiplica na vasilha hahaha